sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

O grito do aço | Epílogo



O vento açoitava as almas, o suor frio gelava os corpos, espírito e determinação. O medo não possui um rosto, é perversão, se esconde onde todos veem, se mostra quando ninguém olha, dança no meio da noite, urra de prazer e exige tributos em sangue. Por três dias e duas noites haviam resistido, hordas pereceram, milhares caíram, o mais belo sonho transmutado em pesadelo. O sol lhes confidenciava o futuro, as sombras cada vez mais longas eram um mau presságio, um sinal de agouro que os mais fortes de coração apenas fingiam ignorar. Porém, no inferno onde seus pés pisavam coragem não era mérito. Olhavam para frente, no meio do vale, entre as sombras amorfas, incertas, quase líquidas, não se podia diferenciar coisa alguma, tão pouco vozes, mas elas estavam lá, na sombra da montanha que, cada vez mais próxima, cobria de horror e desolação o campo de batalha. As feras levaram filhos e esposas, irmãos e avós, amigos e amores, não existia um lar para curar as feridas, não havia para onde voltar. Nuvens pesadas ocultavam o sol como em uma brincadeira infantil, a vida e a morte jogando diante de seus olhos, a luz, temida pelas bestas, era sua proteção, não ousavam atacar enquanto ela brilhasse, todavia a tarde se esvaía, a escuridão logo lhes faria companhia. Em cada homem o peso da própria lápide, sem epitáfio, sem lágrimas, presente apenas o pesar e negrume da morte certa, esperada, para alguns libertadora. Sorrisos eram vistos, os rostos mais jovens traziam um ou outro, os donos no peito ainda carregavam vãs esperanças de um futuro, qualquer futuro

Dorian sabia que era sua última batalha, sentia isto em cada músculo do corpo, olhava para trás e via seus homens, pais de filhos mortos, maridos de esposas assassinadas. Segurava a espada com toda força que lhe restava, a lâmina pesava, o cabo escorregava, o suor frio brotava de cada poro, observava as sombras cada vez mais próximas, o tempo corria centímetro por centímetro. O sol caia rapidamente, um aroma ferroso empesteava o ar, os homens recuavam na medida em que o pavor avança em seus corações. A hora se aproximava, não era tempo de covardia, Dorian urrou com toda a força de seus pulmões, parecia um animal enlouquecido, ganiu e gritou em direção às sombras, olhou para os homens, levantou o braço com a espada e, como se tentasse descobrir se ainda vivia, urrou novamente, olhos arregalados como os de um louco. Era chegado o momento, poucos metros de luz os separavam das sombras, um ou outro membro emergia do breu, olhos vermelhos sorriam famintos. Os homens olharam o céu, algumas estrelas já se mostravam, abaixo dentes amarelados, garras e o hálito podre prenunciavam o que viria. A lua surgiu ao mesmo tempo em que o sol se esvaia por detrás dos montes. Por um momento houve medo, horror e dor, em seguida não.

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