Floresta era uma pequena fada, daquelas com asas de inseto, pele
um pouquinho esverdeada, olhos profundos e negros. Era uma fadinha doce e
inocente, muitas vezes um tanto distraída. Floresta era bem bonitinha, usava um
vestidinho ousado, diziam as fadas mais velhas, feito de folhas e um cinto de
vime, nada nos pés, gostava de sentir o chão úmido e coberto de folhas, claro,
nunca ao mesmo tempo, pois Floresta não era muito maior do que a maior parte
das folhas, sendo difícil pisar ao mesmo tempo na terra e na vegetação. A
fadinha gostava de voar bem alto, acima das copas das árvores e sentir o sol,
depois voava por entre os galhos sorrindo, bem quentinha, assobiando e
cumprimentando um passarinho aqui e ali. Porém aquilo que Floresta mais gostava
era o Vento, seu namorado, podia passar horas voando junto dele, ouvindo seus
murmúrios e sussurros. Durante o dia os dois não se separavam, o Vento sempre
lhe contando o que acontecia por toda a mata. Não que fosse necessário, a
fadinha de tudo sabia, nada do que ali acontecia lhe passava despercebido,
ela era Floresta. Durante a noite quando ia dormir procurava uma flor, se
cobria com alguma pétala bem macia e sonhava enquanto o Vento lhe acariciava os
cabelos verdes escuros. Essa sempre foi a vida da nossa pequena Floresta, de
uma flor para a próxima, se esquentando um pouco sob o sol, voando de mãos
dadas com o Vento e conversando com os passarinhos.
Um dia, porém, algo aconteceu, Floresta acordou e estranhou
alguma coisa, entretanto não sabia bem o quê. Voou até o alto das árvores,
faltava alguma coisa, algo que sempre estava presente e que hoje havia sumido.
Ela desceu, passou distraída pelos passarinhos e sentou em uma folha bem
larga e enrugada. O que estava faltando? Não conseguia lembrar e resolveu ir
falar com o... Vento! Onde estava? Desde que acordara não o sentira, nem uma
brisa, nada. Não conseguia ouvi-lo, nem seus assobios ao longe, nadinha.
Floresta estava preocupada, onde estava seu amado? Às vezes ele ia lá em
cima, sobre as árvores e foi para onde a fadinha voou, só que dessa vez se viu
sozinha no topo das árvores, o quentinho do sol não lhe aqueceu, sentia um frio
estranho e as asinhas cansavam, ela estava pesada, o coração lhe jogava para
baixo. Ela desceu, desceu até chegar ao chão úmido ao lado do Riacho, que ao vê-la
tão cabisbaixa ficou intrigado.
- Ei, Floresta, o que está acontecendo? Estas sempre
passeando, cantando e assobiando, sorrindo e dando cambalhotas, o que está
errado?
- Riacho, não consigo encontrar o Vento. Esperei que ele
aparecesse, procurei no alto das árvores e embaixo, mas não vi nem ouvi nada.
O pequeno rio ficou encucado e se tivesse uma boca teria
mordido o lábio. Sentia muita pena da fadinha e queria ajudá-la, mas tinha medo
de fazê-la sofrer contanto o que sabia. Pensou. Pensou mais um pouco e resolveu
falar.
- Sabes que começo lá atrás na Montanha, que é muito
simpática, apesar da rigidez com que trata os outros, e vou até depois da
praia. Acontece que as vezes vejo algumas coisas e acho melhor não falar, só
que não posso deixar de te contar isso, ainda mais vendo essas pequenas florezinhas
brotando das tuas lágrimas. – disse um contrariado Riacho.
- Sabes de alguma coisa? Viu o Vento em algum lugar?
- Eu sigo o fluxo, sabe? Para mim não existe meio certo ou meio
errado, ou sobe ou desce, entende? Não gosto de falar dos outros, mas acho que
deverias ir até a praia e procurar lá, quem sabe o encontres.
- Muito obrigada, Riacho! – gritou Floresta, dando um beijo
no riozinho e quase se afogando.
E Floresta saiu voando. Voava o mais rápido que podia,
desviava de árvores, coelhos e passarinhos, tinha os olhos úmidos e um sorriso
no rosto, ia enfim encontrar seu amado Vento. Quase o dia todo sem o ver,
estava preocupada e com muitas saudades, subiu até as copas das árvores e deu
uma pirueta, voltou ziguezagueando entre galhos e folhas, acelerou mais um
pouco e viu o brilho do sol no Mar, continuou mais um pouco e avistou a areia
branca. Parou um pouco até se acostumar com a luz, continuou mais devagar até
chegar à praia. Não podia sair da mata, então se sentou na pontinha do
último fio de grama, ficou lá, ouvindo e observando, procurando pelo Vento,
onde ele estava? Só via a areia branca e o Mar, ah, o Mar! Quase nunca o
via, o Vento dizia que ele tinha sal e que isso fazia mal para ela. Floresta
deu uma risadinha e sentiu o coração ficar mais leve e quente, lembrou como o
namorado se preocupava com ela, porém ainda não conseguira encontra-lo. Olhou,
olhou e olhou de novo, para todos os lados, colocou a mão atrás das orelhas e
tentou ouvir. Até que ouviu.
Era um som alto, na verdade já o estava ouvindo há tempo, lá
do meio das árvores. Procurou a fonte do barulho, era o Mar. Percebeu que ele
fazia esse barulho quando as ondas quebravam perto da praia, era bonito, um pouco
assustador, mas bonito. Ela ficou olhando aquilo, vendo como as gotas de água
voavam no ar depois que cada onda quebrava, como flutuavam no... Vento! Floresta
olhava sem acreditar, o Mar era gigantesco e até onde conseguia ver haviam
pequenas ondas feitas pelo Vento! Ele acariciava o mar, se deitava sobre ele e
depois rolavam juntos na praia. Era demais para a fadinha, ela chorava,
sentia-se traída, enganada, o coração parecia pesar uma tonelada, não conseguia
voar, não conseguia sequer levantar dali e ir embora. A fadinha chorou copiosamente, chorou como
nunca antes havia chorado, chorou de dor e de saudade, chorou sem saber mais do
que estava chorando, mas continuou chorando mesmo assim. Floresta chorou até ficar
sem lágrimas, chorou até secar e restar apenas galhos retorcidos e areia.